inscitia on Nostr: Em Trópico de Capricórnio, Henry Miller escreve Quando chegou a época de minhas ...
Em Trópico de Capricórnio, Henry Miller escreve
Quando chegou a época de minhas férias — que eu não tirava havia três anos, tão ávido estava para fazer da empresa um sucesso! — tirei três semanas em vez de duas e escrevi o livro sobre os doze homenzinhos. Escrevi-o direto, cinco, sete, às vezes oito mil palavras por dia. Pensei que um homem, para ser escritor, tinha de escrever pelo menos cinco mil palavras por dia. Pensei que devia dizer tudo de uma vez — num único livro — e desabar depois. Eu não sabia nada sobre a escrita. Me caguei de medo. Mas estava decidido a varrer Horatio Alger da consciência norte-americana. Acho que foi o pior livro já escrito por alguém. Era um tomo colossal e cheio de defeitos do princípio ao fim. Mas foi meu primeiro livro e me apaixonei por ele. Se tivesse dinheiro, como Gide, eu o teria publicado às minhas custas. Se tivesse tido a coragem de Whitman, eu o ofereceria de porta em porta. Todos a quem o mostrei disseram que era terrível. Exortaram-me a desistir da ideia de escrever. Tinha de aprender, como Balzac, que é preciso escrever volumes antes de assinar um deles. Tinha de aprender, como logo fiz, que se deve desistir de tudo e não fazer mais nada além de escrever, escrever, escrever, escrever, mesmo que todos no mundo nos aconselhem contra isso, mesmo que ninguém acredite na gente. Talvez a gente insista exatamente porque ninguém acredita; talvez o verdadeiro segredo esteja em fazer as pessoas acreditarem. Que o livro fosse inadequado, cheio de defeitos, ruim, terrível, como diziam, era simplesmente natural. Eu tentava fazer no começo o que um homem de gênio só tenta no fim. Queria dizer a última palavra no começo. Era absurdo e patético.
E depois continua:
Hoje, quando penso nas circunstâncias em que escrevi aquele livro, quando penso no material esmagador ao qual tentei dar forma, quando penso no que esperava abranger, dou-me tapinhas nas costas. Dou-me nota dez. Orgulho-me do fato de haver feito dele um fracasso tão miserável; se houvesse conseguido, eu seria um monstro. Às vezes, quando reviso meus cadernos de anotações, quando vejo só os nomes daqueles sobre os quais pensei em escrever, me dá vertigem. Cada homem vinha a mim com um mundo seu; vinha a mim e o descarregava em minha escrivaninha; esperava que eu o pegasse e pusesse nos ombros. Eu não tinha tempo de fazer um mundo meu: tinha de permanecer fixo como Atlas, meus pés nas costas do elefante e o elefante nas costas da tartaruga. Perguntar em cima do que ficava a tartaruga teria sido loucura.
Quando chegou a época de minhas férias — que eu não tirava havia três anos, tão ávido estava para fazer da empresa um sucesso! — tirei três semanas em vez de duas e escrevi o livro sobre os doze homenzinhos. Escrevi-o direto, cinco, sete, às vezes oito mil palavras por dia. Pensei que um homem, para ser escritor, tinha de escrever pelo menos cinco mil palavras por dia. Pensei que devia dizer tudo de uma vez — num único livro — e desabar depois. Eu não sabia nada sobre a escrita. Me caguei de medo. Mas estava decidido a varrer Horatio Alger da consciência norte-americana. Acho que foi o pior livro já escrito por alguém. Era um tomo colossal e cheio de defeitos do princípio ao fim. Mas foi meu primeiro livro e me apaixonei por ele. Se tivesse dinheiro, como Gide, eu o teria publicado às minhas custas. Se tivesse tido a coragem de Whitman, eu o ofereceria de porta em porta. Todos a quem o mostrei disseram que era terrível. Exortaram-me a desistir da ideia de escrever. Tinha de aprender, como Balzac, que é preciso escrever volumes antes de assinar um deles. Tinha de aprender, como logo fiz, que se deve desistir de tudo e não fazer mais nada além de escrever, escrever, escrever, escrever, mesmo que todos no mundo nos aconselhem contra isso, mesmo que ninguém acredite na gente. Talvez a gente insista exatamente porque ninguém acredita; talvez o verdadeiro segredo esteja em fazer as pessoas acreditarem. Que o livro fosse inadequado, cheio de defeitos, ruim, terrível, como diziam, era simplesmente natural. Eu tentava fazer no começo o que um homem de gênio só tenta no fim. Queria dizer a última palavra no começo. Era absurdo e patético.
E depois continua:
Hoje, quando penso nas circunstâncias em que escrevi aquele livro, quando penso no material esmagador ao qual tentei dar forma, quando penso no que esperava abranger, dou-me tapinhas nas costas. Dou-me nota dez. Orgulho-me do fato de haver feito dele um fracasso tão miserável; se houvesse conseguido, eu seria um monstro. Às vezes, quando reviso meus cadernos de anotações, quando vejo só os nomes daqueles sobre os quais pensei em escrever, me dá vertigem. Cada homem vinha a mim com um mundo seu; vinha a mim e o descarregava em minha escrivaninha; esperava que eu o pegasse e pusesse nos ombros. Eu não tinha tempo de fazer um mundo meu: tinha de permanecer fixo como Atlas, meus pés nas costas do elefante e o elefante nas costas da tartaruga. Perguntar em cima do que ficava a tartaruga teria sido loucura.