The Narrator on Nostr: **O estranho silêncio sobre a visita da Comissão Interamericana de Direitos ...
**O estranho silêncio sobre a visita da Comissão Interamericana de Direitos Humanos**
*Artigo de Henrique Zétola publicado em 13/02/2025 na Gazeta do Povo*
O tema da liberdade de expressão tem ocupado as manchetes do Brasil por alguns anos. Os casos de abuso pululam. Para um lado, há quem aponte a extrapolação do uso das redes: desinformação, discurso de ódio, incitações antidemocráticas – com plataformas digitais, em certa medida, vistas como coniventes. Para outro, pipocam denúncias de que o Judiciário teria amordaçado influenciadores e opositores, banindo contas e até plataformas inteiras em inquéritos conduzidos sob sigilo – com o Executivo e a imprensa como cúmplices.
Nesse caos, desembarcou em nosso país o relator para a Liberdade de Expressão da Organização dos Estados Americanos (OEA), Pedro Vaca, incumbido de conversar com os diversos lados desse complexo quebra-cabeça. A OEA, por meio de sua Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e da Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão (RELE), tem competência para monitorar e promover o cumprimento dos direitos humanos, incluindo a liberdade de pensamento e expressão, em todo o hemisfério ocidental.
De acordo com anúncio oficial da RELE, a CIDH faz sua primeira visita oficial ao Brasil liderada especificamente por essa Relatoria. O convite, feito em outubro de 2024, nasceu de uma conjuntura peculiar: parlamentares de direita tentaram agendar uma reunião na sede da OEA em Washington, mas, para evitar conflitos, viram o encontro ser adiado pela organização. A solução intermediária foi o Estado brasileiro formalizar o convite à Relatoria.
A CIDH detém atribuições para investigar e recomendar soluções a possíveis violações de direitos, podendo, inclusive, propor medidas cautelares. Esse escrutínio internacional, embora possa gerar desconforto em determinados grupos, contribui para fortalecer a democracia. Trazendo um olhar plural, a comissão pode estimular o país a aprimorar suas instituições e a criar melhores práticas para equilibrar a proteção de direitos e a repressão a abusos.
Era de se esperar que a chegada de Pedro Vaca mobilizasse a atenção nacional, mas o que se tem visto – fora de certos círculos – é uma espécie de silêncio obsequioso. Seria natural esperar que a imprensa, sempre atenta ao que acontece nos corredores do poder, fizesse um estardalhaço diante da chegada de um órgão internacional incumbido de avaliar nossa situação em matéria de liberdade de expressão. O curioso é que esse alarde, até agora, não se viu.
A verdade é que alguns grupos temem que a Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão da CIDH seja usada como bandeira política por forças mais à direita. A Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) chegou a alertar para a “instrumentalização do direito à liberdade de expressão por setores políticos conservadores e de extrema-direita”, algo que, em sua visão, contraria a garantia de direitos humanos e silencia grupos historicamente vulnerabilizados.
É justamente nesse contexto de tensões e desconfianças recíprocas que a presença de uma instância externa, independente e com larga expertise pode contribuir para reduzir polarizações e esclarecer pontos-chave sobre a liberdade de expressão. Mais que um constrangimento ao Brasil, a visita pode representar uma oportunidade de amadurecimento democrático, reforçando o compromisso do país com a salvaguarda de direitos fundamentais.
Espera-se que do relatório e das conversas decorrentes dessa missão da CIDH surjam propostas de ações concretas. Há demandas latentes, como o fim do sigilo no chamado “inquérito das fake news”, cuja transparência seria fundamental para dissipar suspeitas de arbitrariedade. De modo geral, o debate público sairia fortalecido se encarássemos essa visita não como uma interferência, mas como uma chance de revisitar práticas, escutar diferentes vozes e, quem sabe, chegar a entendimentos mais sólidos sobre como conciliar, na vida real, a livre expressão e a responsabilidade.
No final, trata-se de um teste de maturidade democrática. Que o silêncio obsequioso se converta em debate genuíno, permitindo que o país encontre caminhos equilibrados para a proteção efetiva da liberdade de expressão – direito esse que forma a espinha dorsal de qualquer sociedade que se pretenda livre.
Fonte: https://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/artigos/o-estranho-silencio-sobre-a-visita-da-comissao-interamericana-de-direitos-humanos/
*Artigo de Henrique Zétola publicado em 13/02/2025 na Gazeta do Povo*
O tema da liberdade de expressão tem ocupado as manchetes do Brasil por alguns anos. Os casos de abuso pululam. Para um lado, há quem aponte a extrapolação do uso das redes: desinformação, discurso de ódio, incitações antidemocráticas – com plataformas digitais, em certa medida, vistas como coniventes. Para outro, pipocam denúncias de que o Judiciário teria amordaçado influenciadores e opositores, banindo contas e até plataformas inteiras em inquéritos conduzidos sob sigilo – com o Executivo e a imprensa como cúmplices.
Nesse caos, desembarcou em nosso país o relator para a Liberdade de Expressão da Organização dos Estados Americanos (OEA), Pedro Vaca, incumbido de conversar com os diversos lados desse complexo quebra-cabeça. A OEA, por meio de sua Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) e da Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão (RELE), tem competência para monitorar e promover o cumprimento dos direitos humanos, incluindo a liberdade de pensamento e expressão, em todo o hemisfério ocidental.
De acordo com anúncio oficial da RELE, a CIDH faz sua primeira visita oficial ao Brasil liderada especificamente por essa Relatoria. O convite, feito em outubro de 2024, nasceu de uma conjuntura peculiar: parlamentares de direita tentaram agendar uma reunião na sede da OEA em Washington, mas, para evitar conflitos, viram o encontro ser adiado pela organização. A solução intermediária foi o Estado brasileiro formalizar o convite à Relatoria.
A CIDH detém atribuições para investigar e recomendar soluções a possíveis violações de direitos, podendo, inclusive, propor medidas cautelares. Esse escrutínio internacional, embora possa gerar desconforto em determinados grupos, contribui para fortalecer a democracia. Trazendo um olhar plural, a comissão pode estimular o país a aprimorar suas instituições e a criar melhores práticas para equilibrar a proteção de direitos e a repressão a abusos.
Era de se esperar que a chegada de Pedro Vaca mobilizasse a atenção nacional, mas o que se tem visto – fora de certos círculos – é uma espécie de silêncio obsequioso. Seria natural esperar que a imprensa, sempre atenta ao que acontece nos corredores do poder, fizesse um estardalhaço diante da chegada de um órgão internacional incumbido de avaliar nossa situação em matéria de liberdade de expressão. O curioso é que esse alarde, até agora, não se viu.
A verdade é que alguns grupos temem que a Relatoria Especial para a Liberdade de Expressão da CIDH seja usada como bandeira política por forças mais à direita. A Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) chegou a alertar para a “instrumentalização do direito à liberdade de expressão por setores políticos conservadores e de extrema-direita”, algo que, em sua visão, contraria a garantia de direitos humanos e silencia grupos historicamente vulnerabilizados.
É justamente nesse contexto de tensões e desconfianças recíprocas que a presença de uma instância externa, independente e com larga expertise pode contribuir para reduzir polarizações e esclarecer pontos-chave sobre a liberdade de expressão. Mais que um constrangimento ao Brasil, a visita pode representar uma oportunidade de amadurecimento democrático, reforçando o compromisso do país com a salvaguarda de direitos fundamentais.
Espera-se que do relatório e das conversas decorrentes dessa missão da CIDH surjam propostas de ações concretas. Há demandas latentes, como o fim do sigilo no chamado “inquérito das fake news”, cuja transparência seria fundamental para dissipar suspeitas de arbitrariedade. De modo geral, o debate público sairia fortalecido se encarássemos essa visita não como uma interferência, mas como uma chance de revisitar práticas, escutar diferentes vozes e, quem sabe, chegar a entendimentos mais sólidos sobre como conciliar, na vida real, a livre expressão e a responsabilidade.
No final, trata-se de um teste de maturidade democrática. Que o silêncio obsequioso se converta em debate genuíno, permitindo que o país encontre caminhos equilibrados para a proteção efetiva da liberdade de expressão – direito esse que forma a espinha dorsal de qualquer sociedade que se pretenda livre.
Fonte: https://www.gazetadopovo.com.br/opiniao/artigos/o-estranho-silencio-sobre-a-visita-da-comissao-interamericana-de-direitos-humanos/